"Back to formula" na atividade acadêmica e na atividade política


Quero (tentar) brevemente falar sobre uma situação não-agradável, por requerer um esforço não-planejado, mas extremamente necessário, que está muito presente na vida de estudantes, (que acreditam!) que exercem sua pesquisa adequadamente, bem como de cidadãos (que acreditam!) que exercem sua atividade política adequadamente, especialmente nas redes sociais.

Uma metáfora para essa situação é uma cena do primeiro filme do Homem Aranha, em que Norman Osborn questiona (e mata) o seu colega de trabalho científico, por dito que o projeto precisava voltar à fórmula ("back to formula"). Isso o irritou profundamente, porque foi dito diante dos clientes do projeto. Há outros pontos em jogo. Osborn dedicou sua carreira e vida pessoal a esse projeto. Sua imagem de sucesso profissional estava em jogo com esse projeto. O caráter científico foi (já estava) engolido pela agenda social. Isso diz muito do que Thomas Kuhn "denuncia" nas revoluções (ditas) científicas. Meu ponto aqui, contudo, é mais ordinário.

Recentemente estive numa semana de filosofia, em que mestrandos, doutorandos e professores apresentaram suas pesquisas. Após 20 minutos de apresentação, havia 10 minutos de discussão e questionamentos. Vou relatar o que me aconteceu e o que aconteceu a dois doutorandos. No meu caso, um desses doutorandos apenas apontou a falta de objetividade da minha comunicação - apenas ouvi. Outros três professores fizeram perguntas específicas para entender certos pontos do assunto. No caso desse doutorando, um dos professores, especialista no autor pesquisado pela tese, colocou que a posição atribuída ao autor em questão era contrária ao que o doutorando havia lido (entendido). Isso implicava rever um ponto básico da sua tese. Já com outro doutorando, outro professor foi mais "duro", porque a noção básica de toda a tese estava baseada num equívoco enorme. O professor chegou a dizer: "precisa rever não amanhã, mas hoje mesmo a sua tese". Os doutorandos, com certo espanto, mostraram a postura de rever suas "fórmulas". Ótimo!

Recentemente recebi alguns feedbacks, de um especialista, do texto em desenvolvimento da minha dissertação. Ele me mostrou uma certa falácia e certas ausências. E percebi, ou melhor, reconheci o que estava evitando pensar a respeito, algo bem mais problemático. O problema era que isso era um sintoma de uma leitura apressada, insegura, de um bocado de coisa, da minha parte. Precisei voltar à introdução de uma das obras principais. E isso foi maravilhoso. Ressuscitei nesse processo, ao ponto de não mais colocar novos elementos, como um prato cheio de coisa misturada, mas de modo ordenado, orquestrado, seguro (não mais incorreto como antes). Aliás, voltar à fórmula não é o mesmo de criar a fórmula pela primeira vez. Saber o que errou é muito mais libertador e transformador do que repetir o que acredita ter criado ou descoberto.

Se na pesquisa científica, ouvir um "back to formula" é difícil, apesar de mais comum do que se imagina, parece que esse não é o caso da atividade política nas redes sociais, especificamente no Facebook. Aqui todo mundo é doutor - e há até uma página (de humor) com certificados para cada assunto. Por exemplo, a leitura que se faz de eleitores de x, y ou z é impressionantemente reducionista, como se todo mundo tivesse o mesmo compromisso (de idealização) com um candidato. Diante disso, a pessoa se sente na obrigação de efetuar um processo de pureza em seus contatos, que na prática é implicitamente de segregação.

A humildade anda com os que se voltam à fórmula (semente) de suas vidas (acadêmicas, profissionais, pessoais, entre outras). Já os soberbos reagem (e matam relacionamentos) como duendes verdes, diante de sugestões de retorno à fórmula.

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