O exame da OAB é tão importante quanto uma prova da primeira série

Sou profissional há uns dez anos e não trabalho na área de Direito, mas de TI (Tecnologia da Informação) como analista de sistemas, desenvolvedor ou engenheiro de software (o termo pode ser diferente para algumas empresas porém o sentido é o mesmo). No entanto, não posso deixar de pensar naqueles que não podem ser profissionais por causa de uma prova, após formados, terminada a faculdade e o estágio supervisionado, enfim, todas as etapas para começar uma carreira como trabalhador.

Talvez não tenha os melhores argumentos, contudo espero passar o melhor sentimento, de quem vive próximo daqueles que podem ser excelentes profissionais, todavia estão impedidos por não serem excelentes "estudantes de prova" porquanto não passaram em certos exames.

Será mesmo o baixo desempenho numa prova como o exame da OAB uma constatação de "despreparo dos profissionais para atender às exigências do mercado"?

Provas fazem parte do cotidiano do profissional? Médico, advogado, analista de sistemas precisam diariamente ou anualmente em seus ambientes de trabalho fazerem provas para resolverem os problemas de seus clientes ou usuários de seus serviços? Absurdamente não.

Já havia aprendido há muito tempo em metodologia de ensino superior como as provas não podem ser a (melhor) fonte de avaliação para quem já caminhou por toda uma graduação e está experimentando a realidade do mercado. E por várias razões, entre elas uma é não refletirem a realidade da qual os estudantes são preparados: o dia a dia no trabalho.
Você sempre lembra de tudo todos os dias como se todo conhecimento adquirido fosse necessário num curto espaço de tempo? Com certeza algo inclusive vai se tornando menos frequente e até esquecido, e, é necessário aquela rápida atualizada quando algum problema requer tais assuntos. Esse é o "profissional estudante": sabe onde procurar quando precisar e não se acomoda, estuda para se atualizar conforme a necessidade.
Ora, tenho muitos colegas de trabalho experientes e excelentes (para a empresa) porém dificilmente eles passariam em algum dos concursos da mesma área aplicados hoje em dia. São ruins então por que não passaram? Não atendem às exigências do mercado?

É tão inocente e insensível pensar que sim. 

A inocência se revela quando se conhecem péssimos profissionais com "grandes conhecimentos": desorganizados, não sabem trabalhar em equipe, descompromissados, radicalistas, imorais, desatualizados etc. Além disso, prova de concurso é uma forma de eliminação de candidatos e não um processo adequado de seleção de trabalhadores.

A falta de empatia acontece quando os que defendem a condição da prova para o profissionalismo "esquecem" como a realidade do seu próprio trabalho não depende de tal coisa. E ainda há os que desdenham mesmo após terem criticado tal prova-condição antes de passarem.

A exigência para entrar no mercado não deve ser a mesma para ser excelente nela. São coisas bem distintas. O estágio é a melhor forma de avaliação sem dúvida não só para entrar no mercado mas para o próprio estudante. As pessoas estão vendo seu desempenho na própria rotina e não as respostas de um papel. Estão começando a ver o profissional e não o "estudante de prova".

Para ser excelente no mercado é preciso não apenas conhecimento porém experiência. Ora, não se entrega um problema a um novato esperando a solução de um mestre de grande talento. O talento foi refinado com o tempo e a empresa sabe bem disso. Não se entrega um caso muito importante para quem tem apenas mais conhecimento: o julgamento não será uma prova de papel.

E se o exame é condição para entrar no mercado não deveria ser também para continuar? Certamente muito presidente de OAB, juiz, procurador, entre outros não mais continuariam exercendo sua profissão.

Por isso é tão importante quanto aquele teste da primeira série: avalia o que aprendeu naquele tempo no entanto não determina quem você pode ser num tempo bem maior.

Comentários

Janko disse…
Xiiiiiii pela chamada da crônica, já perdi o tesão em ler. Lamento!
Eliana Chirol disse…
Excelentes colocações, Aislan. E o assunto só interessa a quem, de fato, vivencia essas situações,seja no ensino, na advocacia ou em qualquer área de trabalho.A verdade é que este assunto deve ser de interesse a todo e qualquer ser humano que exerça uma profissão.
Parabéns!
Eliana Chirol.

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