Qual a postura correta em assuntos delicados


Cedo ou tarde, acabamos lidando com algum assunto delicado na vida, por pouco ou muito tempo, que nos deixa com muitas dúvidas e muita pressão para tomar alguma atitude, podendo, de alguma forma, querendo ou não, deixar alguém, no mínimo, insatisfeito.

Em adolescentes (e jovens próximos dessa fase), a dificuldade pode ser maior ainda, porque a sociedade (ao redor ou como um todo) cobra uma posição extremamente madura, mas a própria lei diz que é uma pessoa em desenvolvimento: "artigo 227 da Constituição Federal e no artigo 4º do ECA, segundo o qual a criança e do adolescente merecem atenção especial pela sua vulnerabilidade, por serem pessoas ainda em fase de desenvolvimento da personalidade" (referência [1]).

E em cristãos, a coisa piora de vez, porque a atitude polarizada (decidir apenas pelos extremos) é muito frequente, conforme já denunciava  John Stott: "Contudo, nós não somos unidos. Nós nos separamos uns dos outros por assuntos pouco importantes. Algumas das questões que nos dividem são teológicas; outras temperamentais. Teologicamente, por exemplo, podemos discordar na relação exata entre soberania divina e responsabilidade humana, na “ordem” e ministério pastoral da igreja (se deve ser episcopal, presbiteriano ou independente) e até onde os crentes podem envolver-se numa “mistura” denominacional sem que se comprometam a si mesmos e a fé que professam; nas relações Igreja-Estado; em quem está qualificado para ser batizado e no volume de água a ser usado; em como interpretar profecia, em quais dons espirituais estão disponíveis hoje e quais são os mais importantes. Estas são algumas das questões nas quais crentes igualmente dedicados e bíblicos discordam entre si. São questões que os reformadores chamam de “adiaforia”, questões “indiferentes”. Desta forma, embora pretendemos continuar defendendo nossa própria convicção das Escrituras, em conformidade com a luz que nos tem sido dada, procuraremos não pressionar dogmaticamente a consciência de outros crentes, mas tratar a cada um com liberdade, em amor e respeito mútuo. Não se pode fazer coisa melhor do que mencionar o famoso epigrama atribuído a um certo Rupert Meldenius e citado por Richard Baxter. Em coisas essenciais, unidade; nas não-essenciais, liberdade; em todas as coisas, caridade." (referência [2]).

Assim alguns líderes não sabem falar de questões delicadas e preferem a via da coerção (ato de induzir, pressionar ou compelir alguém a fazer algo pela força, intimidação ou ameaça [3]), em vez da graça. Isto é, "pregam" um discurso para crentes ouvirem, não o evangelho para o arrependimento ou para o cristão poder dá razão de sua fé, como recomenda esta passagem: "estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós" (1 Pedro 3.15).

O motivo dessa preferência pela coerção talvez não seja insensibilidade, que pode ser apenas uma consequência da ignorância de todo contexto, a falta de vivência desse contexto ou o despreparo. Logo seria um caso, pelo menos, de imprudência desse líder: um cego guiando cegos.

Porém na prática não dá para esperar alguém lhe explicar sobre todas as questões delicadas que aparecem em sua vida, muitas delas bem particulares e atípicas. E aí, antes de mais nada, para não tomar posturas extremas, quando não são necessárias, vale o conselho do Charles R. Swindoll:

"O problema não são as regras. Às vezes são necessárias para deixar claro o que se quiser dizer. Porém deixemos claro o propósito e/ou o contexto dessas regras – em sua maioria de aplicação local ou ocasional – para não generalizarmos e por fim ensejarmos a liberdade no contexto da graça." (referência [4]).

Assim, no contexto da graça, é preciso dá espaço para a pessoa crescer, pensar, e por si mesmo, fazer perguntas. Logo, ame de forma despretensiosa.

E nisso consiste o amor, não necessariamente na identidade entre quem ama e é amado, mas o amor "é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta." (1 Coríntios 13:4-7).

Nem todo assunto delicado se entende completamente, muito menos com a leitura de um texto, ou podendo ocorrer com anos de experiência ou ao fim de uma vida inteira, mas é preciso não generalizar certas posturas para não se tornar um assassino da graça ou, por outro lado, uma pessoa sem identidade.

Amar não é falar a verdade, mas suportar, sofrer e esperar o outro entendê-la.


[2] John Stott. Cristianismo Equilibrado - Unidade, Liberdade e Caridade. Documento online em: http://www.monergismo.com/textos/advertencias/cristianismo_equilibrado.htm
[3] Wikipedia. Coerção. Documento online em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Coer%C3%A7%C3%A3o

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