Natural, Sobrenatural e Supranatural


Como pode ter lido em Gênesis, a origem do homem pode ser entendida em termos naturais, mesmo não exaustivamente, mas não apenas de forma antinatural.

Na verdade, popularmente tem havido uma diferença entre eventos naturais e sobrenaturais em que o primeiro rege-se por leis da natureza, mas o segundo, não. Exemplo dessa mentalidade são os milagres.

Sproul, nesse sentido, chama a atenção para os diferentes usos do termo milagre (Sproul, 1999, pp. 59, 60):
  • Uso leviano ou rotineiro, como um pôr-do-sol ou escapar por um triz;
  • Deus operando por “meios secundários das leis naturais”, referindo “às coisas comuns que apontam para uma causa incomum no poder de Deus”, como a complexidade do nascimento de um bebê;
  • Deus operando por “meios secundários num tempo e lugar mais específicos”, como a estrela de Belém;
  • Deus “contrariando o que é natural”, como a ressurreição de mortos, na qual “pode não haver nenhuma explicação natural para tais eventos”.

Certamente o autor de Gênesis não teve a preocupação em descrever a formação das espécies da forma mais natural possível, como conhecemos hoje, isto é, em termos científicos, que, na verdade, sempre se modificam com o tempo (qual seria o termo mais adequado ou a explicação mais precisa?).

No entanto, ficou evidente sua preocupação maior em atribuir a responsabilidade soberana de tais eventos ao Criador, de forma simples, sem a complexidade envolvida em toda a natureza. Aliás, a intenção dos autores bíblicos em descrever os milagres não está relacionada com o objetivo de invalidar as Ciências Naturais ou lutar contra elas (o que seria um absurdo para a época), mas são sinais, prodígios ou maravilhas que “apontam para além de si mesmos, para algo mais significativo”, como o poder dado a Moisés “a fim de demonstrar que o tinha enviado” ou “o Pai autenticar o ministério do Filho” (Sproul, 1999, p. 60).

Além disso, a forma natural como percebemos ou verificamos as coisas, com cientificidade ou não, é apenas de uma porção da realidade, num fragmento do tempo, pois já não é possível acompanhar certos eventos que se iniciaram no passado (muitas vezes, únicos na história) e não mais existem, ou os que irão começar no futuro e ainda não existem, ou mesmo, os que estão no presente, porém numa unidade de tempo diferente. Aliás, "para Agostinho Deus não criou o mundo no tempo, mas com o tempo”, a “criatura temporal de Deus”, que “está próximo da alma do homem”, como algo “psicológico, uma percepção de sucessão contínua no campo da consciência com aspecto de localização e de anterioridade”, “uma distensão da alma, pois posso estender ou encurtar a duração das sílabas pronunciada num verso” (JUNIOR, 1995).

É tolice, então, atribuir toda naturalidade ao científico (esse foi o grande paradigma do Naturalismo[1] filosófico), como também adotar uma crença num sobrenatural, que vai contra as “leis da natureza” (que não são absolutas e exaustivas!), em função do desconhecido, uma vez que o próprio Deus as determinou para serem assim.

Ora, rotular algum evento de antinatural é conhecer o fenômeno o suficiente para concluir que não pode ser natural. O quanto a nossa ciência é capaz de conhecer as coisas? Pouco tempo atrás a Física Quântica era uma ficção, um milagre ou uma loucura.

Assim, de agora em diante, a palavra supranatural será o natural não alcançado pelo homem, apontando para o plano eterno de Deus, que não é o “tempo dilatado ou esticado, mas a simultaneidade de todas as coisas” (JUNIOR, 1995), porém ocorrendo na realidade do tempo, para privilégio dos homens, por meio de suas Ciências, de modo a não ser confundido com o sinônimo sobrenatural, já carregado de outro sentido.



[1] É "a visão de que o método científico é a única forma efetiva de investigar a realidade universal" (NATURALISMO, 2013)

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JUNIOR, O. M. (1995). TEMPO - DISTENSÃO DA ALMA HUMANA: UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE O TEMPO EM AGOSTINHO DE HIPONA. Brasília: Universidade de Brasília (UnB).

NATURALISMO. (2013). Naturalismo (filosofia). Acesso em 4 de 6 de 2013, disponível em Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Naturalismo_(filosofia)

Sproul, R. C. (1999). Verdades Essenciais da Fé Cristã: doutrinas básicas em linguagem simples e prática. São Paulo: Cultura Cristã.

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