Sou contra o Projeto “Cura Gay” e a favor do PDL 234/2011
Por diversos ângulos é possível
entender a confusão em torno do projeto, conhecido popularmente como “Cura
Gay”, “do pastor” Feliciano: a desinformação direta e indireta pelos meios de
comunicação; fuga da oposição ao bom debate com má retórica; e a
superficialidade da opinião de massa.
Uma vez entendidos esses ângulos,
é necessário olhar para uma minoria, ainda pouco conhecida, assim como foram os
gays em outras épocas ou são em outras sociedades mais rígidas, mas que aos
poucos estão surgindo e precisam de direitos humanos também.
"A sexualidade não é um número, ela se constrói num corpo e numa mente inseridos numa cultura. Só aí, temos milhares de aspectos subjetivos. Várias psicólogas e psicanalistas contemporâneas, a exemplo da Psic. Regina Navarro, dizem, por exemplo, que a tendência da sociedade no futuro é ser bissexual".
De antemão, para não atrapalhar o
seu entendimento, em função do filtro cognitivo que possa existir, saiba que sou contra a tal “cura gay”, mas a favor do PDL 234/2011. E ao
final dessa leitura entenderá as razões.
A desinformação incapacita o
cidadão em exercer sua cidadania com verdadeira imparcialidade ou justiça, pois
os fatos são ocultados pelas percepções (estreitas) de opositores e defensores.
Existe nos meios de comunicação,
formais (jornais e sites de notícias) e informais (redes sociais), muita
notícia repassada sem a menor análise dos fatos, não separando opinião
desonesta ou declarações sem fundamento do fato.
É o caso do PDL 234/2011.
Seria
um choque tremendo se as pessoas soubessem desse projeto (não deixe de ler na
íntegra!), sem opiniões de A ou B, que não tem nada haver com “cura gay”,
conforme parte do relatório do Relator, deputado Roberto de Lucena, da Comissão
de Seguridade Social e Família:
- Objetivo: “impedir que o Conselho exerça uma ação coercitiva e de censura com os psicólogos, especialmente em suas manifestações públicas. Procura, assim, garantir o livre exercício da profissão e o inalienável direito de expressão, fundamentos basilares de um Estado democrático”;
- Mérito: “oferecer uma relevante contribuição para impedir que prosperem (...) posições extremadas e autoritárias, que nada colaboram para o melhor enfretamento deste tema tão importante para o ser humano que é a sua sexualidade";
- Escopo: “não versa sobre a prática da homossexualidade, não trata da homoafetividade ou de orientação e opção sexual. A proposta legislativa versa sobre a liberdade e a proibição do psicólogo para atender pessoas com transtornos resultantes de desequilíbrio e de conflitos interiores em decorrência de dúvidas e rejeição de sua opção pela homossexualidade”.
Porém muitos meios apenas estão
repetindo declarações popularizadas pelo movimento LGBT, de que certos grupos
estão querendo promover a “cura gay”, como se a homossexualidade fosse uma
doença, associando com esse projeto.
Na verdade, existem sim grupos
religiosos e instituições que buscam a cura definitiva dos “pecados da
sexualidade” (incluindo masturbação, sexo antes do casamento, sexo anal, oral,
homoafetivo, poligamia, atrações e desejos a esses tipos de sexualidade etc).
Exemplo maior disso era a organização Exodus
International, que recentemente “fechou as portas” com pedido de desculpas,
pois passaram a ter uma postura mais cristã, acolhendo cada um em suas
fraquezas sem imposição de mudança.
Outra infelicidade nesse contexto
é também a preferência religiosa do deputado e pastor Marcos Feliciano, cuja
Teologia da Prosperidade é altamente questionada por várias igrejas cristãs (e por mim!). Contudo é necessário separar as coisas.
No entanto, a associação entre
“cura gay” e o PDL 234/2011 é uma má retórica, pois tal apelido condena qualquer
forma de discussão positiva sobre o assunto. Você, como cidadão comum, sem
religião, vai discutir com alguém que quer curar os gays, por motivos
religiosos?
As notícias e declarações
públicas seguintes, de fato, assim como outras semelhantes, não permitem a boa retórica:
- "A SPM avalia que a aprovação do Projeto de Decreto Legislativo 234/11, conhecido como "cura gay", pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, no dia 18 de junho de 2013, coloca-se na contramão dos direitos humanos e da Organização Mundial da Saúde, a qual não considera a homossexualidade como doença. A OMS, inclusive, há muito tempo retirou a homossexualidade do Código Internacional de Doenças /CID” (Secretaria de Políticas para as Mulheres);
- O "projeto que permite aos psicólogos promover tratamento com o objetivo de curar a homossexualidade" (Folha de S.Paulo);
- “Se somos doentes, somos inválidos. Logo, temos que nos aposentar” (Toni Reis, diretor-executivo do grupo Dignidade, de apoio a homossexuais).
Ora, o próprio relator esclarece:
“quanto ao “reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos
homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica” não parece ser uma
questão de preconceito existente com relação àqueles que sentem atração pelo mesmo
sexo, pois a própria OMS-Organização Mundial de Saúde, mantém em sua
Classificação Estatística das Desordens Mentais e Comportamentais, CID 10, ou
seja, sua décima edição, em vigor, várias desordens ligadas à sexualidade,
incluindo às ligadas à orientação sexual. Isto pode ser observado, por qualquer
do povo, inclusive no site da OMS”.
Portanto, com as palavras do deputado Roberto de Lucena, “nenhum paciente, seja ele
apresentando qualquer desordem/transtorno sexual, resultante de preferência
sexual ou orientação sexual ou qualquer outra, deve ser cerceado do direito à
atenção psicológica, desde que seja uma decisão voluntária, seja qual for a
razão que o tenha motivado a buscar apoio junto ao profissional da Psicologia”.
Mas, para entender melhor a crítica do
PDL a dois parágrafos de uma resolução do CFP, veja abaixo esses mesmos
parágrafos com omissões de trechos a respeito da homossexualidade:
Art. 3° - os psicólogos não exercerão qualquer ação que
favoreça a patologização de comportamentos ou práticas _________, nem adotarão
ação coercitiva tendente a orientar ________ para tratamentos não solicitados.
Parágrafo único - Os psicólogos não colaborarão com eventos e
serviços que proponham tratamento e cura das __________.
Art. 4° - Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão
de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a
reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos __________ como
portadores de qualquer desordem psíquica.
Agora troque esses trechos sublinhados por
heterossexualidade. Entende o problema? Obviamente é um absurdo a tal “cura
gay”, mas, na defesa de direitos humanos aos que querem viver com felicidade
sua homossexualidade, não se está incentivando também uma “cura hetero”?
Então é preciso o cuidado em equilibrar as coisas e não excluir outras minorias que
estão surgindo. Daí a importância em rever o texto para deixar claro.
O projeto então pede apenas a revisão (NÃO A EXCLUSÃO) desses dois textos para
não excluir todas as minorias prejudicadas por questões de sexualidade e não
apenas um grupo específico.
Aliás, a própria CFP já publicou nota dizendo que tais parágrafos "não impede atendimento a pessoas que queiram reduzir seu sofrimento psíquico causado por sua orientação sexual", no entanto "se o paciente supostamente deseja tratar conflitos sobre sua sexualidade, e deseja conduzir seus desejos de modo a ser heterossexual, em vez de homossexual, e a psicóloga ACEITAR a decisão do paciente – ela pode sim, de acordo com o parágrafo único do artigo 3°, ser cassada", por isso o projeto do "deputado não propõe terapias “cura-gay”, e sim a liberdade profissional do psicólogo" (Psicóloga Michele, veja a publicação dela no seu blog).
Se fosse apenas um problema de interpretação, então não haveria tanto movimento contra Marisa Lobo.
Se o fato de existir ex-gays lhe incomoda, incomoda também a
existência de religiosos para alguns ateus e vice-versa. E é preciso saber conviver com a diversidade sem perder a personalidade.
Em especial aos cristãos, também incomoda,
dentro da própria igreja cristã, existirem cristãos, sinceros em sua fé, com
desejos homoeróticos, mesmo eles considerando-os como pecados, frutos da
natureza decaída, ou terem tido relações sexuais antes do casamento, entre
outras coisas, mas que ainda estão crescendo no conhecimento da graça de Deus e
aprendendo a viver e lutar com suas angústias, por amor ao que mais acreditam. E por isso a importância do amor
com tolerância, da graça com amor.
E a angústia da sexualidade, Paulo conhecia bem: “Mas vejo
nos meus membros outra lei, que batalha contra a lei do meu entendimento, e me
prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros” (Romanos 7.23).
Quer entender melhor todo o problema? Olhe para si, leia na íntegra a respeito do que falam, tenha sensibilidade para novos fatos e não seja negligente.
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PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO N.º 234, DE 2011 (Do Sr. João
Campos). Documento disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=881210&filename=PDC+234/2011
Relatório do Relator, deputado Roberto de Lucena, da
Comissão de Seguridade Social e Família. Documento disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1048492&filename=PRL+1+CSSF+%3D%3E+PDC+234%2F2011
RESOLUÇÃO CFP N° 001/99 DE 22 DE MARÇO DE 1999. Documento
disponível em: http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/1999/03/resolucao1999_1.pdf
21/06 - Nota da SPM sobre o Projeto de Decreto Legislativo
234/11. Documento disponível em: http://www.spm.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2013/06/21-06-nota-da-spm-sobre-o-projeto-de-decreto-legislativo-234-11
Grupo que oferecia ‘cura gay’ nos EUA pede desculpas e fecha
as portas. Documento disponível em: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/06/grupo-que-oferecia-cura-gay-nos-eua-pede-desculpas-e-fecha-as-portas.html
Chapter V
Mental and behavioural disorders (F00-F99). Documento disponível em: http://apps.who.int/classifications/icd10/browse/2010/en#/F60-F69
Nota de Esclarecimento da CFP. Documento disponível em: http://site.cfp.org.br/nota-de-esclarecimento/
Projeto de deputado não propõe terapias “cura-gay”, e sim a liberdade profissional do psicólogo. Documento disponível em: http://queremospsicologia.blogspot.com.br/2013/05/projeto-de-deputado-nao-propoe-terapias.html
A hipocrisia da “parcialidade” – desconfie de quem não tem lado. Documento disponível em: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/03/a-hipocrisia-da-parcialidade-desconfie-de-quem-nao-tem-lado.html
Proposta sobre 'cura gay' é aprovada em comissão presidida por Feliciano. Documento disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/06/1297075-proposta-sobre-cura-gay-e-aprovada-em-comissao-presidida-por-feliciano.shtml?fb_action_ids=532578903470700&fb_action_types=og.recommends&fb_source=timeline_og&action_object_map=%7B%22532578903470700%22%3A169603376550347%7D&action_type_map=%7B%22532578903470700%22%3A%22og.recommends%22%7D&action_ref_map=%5B%5D
Comentários
Excelente seu texto, apesar de você subestimar o religioso.
Mais um ótimo: http://www.midiasemmascara.org/mediawatch/outros/14269-qcura-gayq-antes-fosse-manipulacao.html
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