O paradigma do tamanho físico para definir (in)significância


Em 2013 falei sobre este mesmo tema sob o título "O paradigma da lagarta medíocre". Depois de um tempo como estudante de Filosofia, muita coisa mudou, mas o paradigma do tamanho físico para definir (in)significância continua o mesmo. Para se ter uma ideia dessa mentalidade basta fazer uma busca no Google com "nao somos nada no universo". Uma referência bem popular, nesse sentido, é Nietzsche (1844-1900). Esse filósofo alemão "conta que, num recanto distante do universo, uma estrela tinha um planeta a sua volta. Neste, uma raça de insetos viveu por 1 milhão de anos e criou uma coisa chamada conhecimento, que os insetos tinham em alta conta. Com a morte da estrela, tudo se apagou. E o universo continuou no seu silêncio e na sua indiferença" (PONDÉ, 2014).

Segundo o bioquímico americano Behe (1997), a base molecular da vida somente passou a ser eluciada, a partir da década de 1950, com a bioquímica. Antes com Charles Darwin (1809-1882) se pensava a vida como algo extraordinariamente simples, em que funções biológicas, por exemplo, eram mais simples do que televisão, câmera ou automóveis. No entanto a vida, em última instância, é um fenômeno molecular, uma vez que todos os organismos são feitos de moléculas, que funcionam como porcas, parafusos, engrenagens e polias de um sistema biológico.

Segundo Teixeira (2012, p. 48), filósofo brasileiro da mente, "não devemos nos sentir pequenos quando olhamos para o céu e para as estrelas. O cérebro tem a complexidade do universo condensada num espaço tão pequeno quanto a caixa craniana. Seu maior enigma é conter e estar contido no universo ao mesmo tempo". Nesse sentido, devido aos números astronômicos, o filósofo da mente defende que o problema mente-cérebro é intratável e insolúvel, apesar de alguns enxergar o cérebro apenas como o órgão da mente.

O físico Nassim Haramein passou 30 anos pesquisando e descobrindo conexões em física, matemática, geometria, cosmologia, mecâmica quântica, biologia, química, para desenvolver a sua ideia principal de Universo Conectado (tudo está conectado), através de sua Teoria do Campo Unificado.

Antes do Universo Conectado, Gottfried Wilhelm Leibniz, matemático, filósofo e cientista alemão do século XVII, defendia o universo como constituído em última instância por mônadas. Por causas delas, o que conhecemos por matéria, espaço, tempo, entre outras noções das leis da Física newtoniana, seriam fenômenos, e não substâncias permanentes, independentes de como percebemos o mundo. Em especial, chama a atenção o aspecto em que cada mônada é um "espelho vivo do universo" (RUSSELL, 1968, p. 246). Há tentativas atuais em alinhar a noção de mônada de Leibniz com a Física Quântica.

Muito antes de Nietzsche e da Física Quântica, definir valor com base num certo tamanho já era um problema, na mente judáica, uns oito séculos antes de Cristo: "Diante dele todas as nações são como nada; para ele são sem valor e menos que nada. A quem vocês compararão Deus? Como poderão representá-lo?" (Isaías 40:17,18).

Diante do exposto, já é possível perceber um ponto problemático. Se o tamanho físico para argumentar insignificância é correto, então não deveria ser diferente para argumentar o contrário. Antes de 1950, especialmente com a Física Mecânica, a Biologia era encarada de uma forma, por muitos, sem a Neurociência e a Bioquímica. Hoje...

Outro ponto problemático está implícito na ideia de que como o nosso tamanho é (in)significante, logo somos (in)significantes. Assim eu sou o meu tamanho, em relação ao que é (in)significativo. Mas por quê o tamanho físico (um aspecto quantitativo) é mais importante ou o único critério a ser considerado em vez do tamanho funcional (um aspecto qualitativo)? A maior pedra do universo não é mais significante que a menor célula biológica do universo, em termos de tamanho funcional. A célula biológica que antes era tida como uma geléia simples, agora é um sistema bioquímico semelhante a uma nave espacial super avançada.

E nem arranhamos ainda o universo de possíveis sistemas quânticos em meio a sistemas bioquímicos. De qualquer forma, talvez aquele (in)significante gameta feminino fecundado seja suficiente para nos relembrar que ali há um novo universo em expansão.

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BEHE, Michael. A Caixa-Preta de Darwin: o Desafio da Bioquímica à Teoria da Evolução. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
PONDÉ, Luiz Felipe. A era do ressentimento: uma agenda para o contemporâneo. São Paulo: LeYa, 2014.
RUSSELL, Bertrand. A Filosofia de Leibniz (uma exposição crítica). São Paulo: Nacional, 1968.
TEIXEIRA, João de Fernandes. Filosofia do cérebro. São Paulo: Paulus, 2012.

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