A lógica de ser pai


A lógica nem sempre obedece uma lógica, assim como o pai nem sempre é pai. Pensando a essência da lógica, bem distinta de como é vista comumente na atualidade, acabei pensando a essência da minha própria paternidade, já que agora vou ser (!) pai de mais um menino.

O primeiro contato geralmente com a lógica se dá por alguma estrutura formal. Aprende-se, então, a validar alguns argumentos, após formalizá-los em alguma inferência formal. Com o tempo, operadores formais se tornam (!) leis do pensamento, do modo como ocorria entre modernos e medievais. Isto é, aquilo nos faz pensar de determinada forma, ou mesmo o que nos caracteriza como racional, é lógico. Nesse sentido, somos racionais porque pensamos logicamente.

Mas desde o início do século XX, por causa de certas provas formais, surgiram várias lógicas (o pluralismo lógico). Ganhou força o pragmatismo, em suas variadas formas, que não apenas passou a questionar a noção de verdade como fundamental na lógica (formal), como também passou a re-vitalizar a centralidade da (forma de) vida das ações linguísticas. Até o papel da lógica foi repensado, não mais como um instrumento para adquirir ou certificar (a verdade de) o conhecimento, mas para expressar ou explicitar aquilo nos faz pensar de determinada forma. E mesmo a silogística de Aristóteles ganhou esse contorno expressivo. Nesse sentido, pensamos logicamente porque somos racionais. Há algo mais profundo a ser explicitado nessa re-vitalização, que já estava implícito lá desde o princípio. Algo que é capaz de responder o que é a lógica, sem apelar ao formal, que não deixa de ser importante, ainda que instrumental e secundário.

Semelhantemente ocorre com a relação entre pai e genitor. Há algo essencial e algo instrumental, mas invertidos na prática comum. O primeiro contato geralmente com a ideia de ser pai se dá com a gravidez, com a geração física de um ser humano. Com o tempo, a comunidade passa a esperar norma-lmente a figura de pai do genitor. Isto é, espera do físico algo inerentemente não-físico (!). É pai, então, porque é genitor. Mas casas de acolhimento, para citar um exemplo, estão aí para dizer que nem todo genitor segue a regra institucionalizada de ser pai. Pai não é necessariamente o genitor, logo. Na verdade, ser pai é (escolher) seguir a regra de ser pai independentemente de ser genitor. Essa escolha, por ser geralmente implícita, dá um encanto de essencial ao que é instrumentalmente mais visível, em vez do que é conceitualmente anterior.

Hoje tenho a consciência de que adotei antes Gabriel, e agora Eduardo, como meus filhos, ao descobrir que seria genitor deles, pelo instrumento de autoconsciência, de explicitação de conceitos, da lógica.

Os que adotam aplicam ao mesmo tempo o sentido mais essencial e mais visível de serem pais.

"Tu és meu filho, eu hoje te gerei".

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